domingo, 13 de julho de 2008

TETÊ

Era uma velhinha miudinha que andava sempre de preto com um manto cobrindo o rosto e um guarda-chuva debaixo do braço. Todas as noites quando a cidade começava a se acalmar saia ela de sua residência a Rua Cel. Souza Freire. Parava em frente a igreja, se ajoelhava e rezava, depois seguia em direção ao cemitério. A molecada tinha um medo danado da velhinha, mas ela nenhum mal fazia. Quando a meninada dela se aproximava querendo saber como era seu rosto falava palavras incompreensíveis e seguia em frente. Na verdade não sabíamos o por quê daquele hábito soturno, mas era quase como um relógio anunciando que à hora de ir dormir estava próxima, algumas vezes a turma acompanhava de longe para ver o que a velha ia fazer, mas como sempre seu Jessé o coveiro do cemitério, deixava a porta aberta para seu acesso. Dizem que ela ia tão somente fazer suas orações para os parentes já falecidos. Lembro que certa vez Tonho de Lia que instalava antenas de televisão comentou que enquanto colocava uma na casa de uma vizinha da velha, ouviu Tetê conversando com os espíritos. Como era costumeiro faltar energia as noites, certa feita resolvi modelar uma caveira usando um mamão verde e colocando dentro uma vela acesa. Para minha sorte naquela mesma noite a luz foi embora cedo. Quase em frente a minha casa ficava uma das fontes da praça e nela havia uma pedra de cimento redonda. Foi ali mesmo que eu coloquei o meu artefato. As pessoas passavam vindo da missa e se benziam ou diziam coisas do tipo: cruz credo e “vije” Maria. Naquele tempo o jardim da praça ficava sempre bem cuidado e florido. E lá vem Tetê. Chegando perto da fonte para colher algumas flores para levar ao cemitério, finalmente avista a caveira e sai proferindo suas palavras incompreensíveis. Minha mãe vendo o mal feito foi logo me chamando e passando aquele corretivo e eu, sem poder argumentar que a intenção não era assustar a pobre velha. Taí mais uma figura folclórica da antiga Lagarto e que por muito tempo povoou o imaginário da garotada que brincava na Praça da Piedade.

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